O OITAVO MANDAMENTO
Diz uma metáfora de origem judaica, que a Mentira e a Verdade, caminhando juntas num belo dia ensolarado, resolveram tomar banho num rio. A Mentira, traiçoeira, como sempre, se aproveitou do deleite da Verdade nas águas correntes do rio, saiu da água e roubou as vestes da Verdade. Esta, saiu do rio, mas recusou-se a usar as vestes da Mentira e, nua, começou a perseguir a Mentira. As pessoas acolhiam a Mentira vestida de Verdade, mas condenavam a atitude desavergonhada da Verdade. Resumindo: O homem está mais suscetível em receber a Mentira com as vestes da Verdade, do que encarar a Verdade, nua e crua.
Em 2016, a Universidade de Oxford, na Inglaterra, elegeu o “post-truth” ou a “pós-verdade”, como a palavra do ano. Trata-se de um retrato da descrença e da falta de método de informação objetiva na sociedade contemporânea. Nessa época da política da pós-verdade, escolhe-se dados aleatórios (os meios) e chega-se à conclusão desejada (os fins).
Por conseguinte, influenciados pela famosa frase de René Descartes: “penso, logo existo”, o pós-verdade, baseado em critério individual, decreta, “creio, logo é verdade”.
Na bíblia, a palavra “mentira” é citada 51 vezes e a primeira menção é no livro de Gênesis, capítulo 4, versículo 9, quando o Senhor disse a Caim: “Onde está teu irmão Abel?” Caim respondeu: “Não sei! Sou porventura o guarda do meu irmão?”
No livro do Êxodo, capítulo 20, encontramos os Mandamentos da Lei de Deus e o oitavo, dos dez mandamentos é: “Não levantar falso testemunho”. Um eco desse mandamento que condena a mentira e consequentemente, o falso testemunho, está inserido no Código Penal Brasileiro, tipificando como delitos, a calúnia e a difamação.
De acordo com o artigo 203 do CPP – Código de Processo Penal, a testemunha tem o compromisso em dizer a verdade. Na falta dela, caracteriza-se o crime previsto no artigo 342 do CPP, prestar falso testemunho.
No decurso da história, desde os Dez Mandamentos da Lei de Deus, entregue a Moisés, no Êxodo, passando por Santo Agostinho (354 d.C.) que foi um dos estudiosos mais profundos do tema, principalmente em seus dois tratados Contra Mendacium e De Mendacio, transitando por Immanuel Kant, que não tolerava nenhuma mentira intencional e chegando aos nossos Códigos de Processo Civil e Penal, através de vocabulário jurídico, a mentira ou falso testemunho é inaceitável, inadmissível, intolerável e passiva de pena de um até três anos de prisão.
Dia desses recebi de um amigo, uma mensagem pelo WhatsApp com determinada notícia. Automaticamente, procurei a um site de checagem sobre notícias falsas. Não desconfiei do amigo, mas a matéria era muito suspeita. Na postagem continha informações sobre “um juiz de Cuiabá que considerou jovem de 16 anos “maior” de idade por ele possuir Título de Eleitor e o enviou para o presídio”. No lide do texto, constava uma suposta frase do menor, afirmando que “tirou o título on-line horas antes de cometer o crime, para votar no Lula, porque “ele deixa nós roubar”, justificou.
Fiz checagem da matéria na Agência Lupa, a primeira fact-cheking criada no Brasil. Não há nenhuma decisão de quaisquer juízes de Cuiabá, sobre esse assunto. No site da Justiça de Mato Grosso, não foi encontrado informações ou publicações sobre o ocorrido. A Constituição de 1988 considera jovens menores de 18 anos, inimputáveis e sujeitos a regras especiais. A foto publicada na suposta reportagem, mostra um rapaz de 18 anos, preso em setembro de 2016 em Goiânia/GO, por roubo de celular. A busca pela imagem dele consta no Google Imagens, como uma das mais pesquisadas, sob o título de “jovem preso”.
“Nunca se mente tanto como antes das eleições, durante uma guerra, e depois de uma caçada”. Bismark
A disseminação de falsas notícias, não tem outra finalidade a não ser ludibriar, enganar, embaçar, corromper e fraudar, a mente daqueles que, desprovidos de quaisquer discernimentos, são bombardeados diariamente com informações vindas, às vezes, de pessoas insuspeitas. O que leva alguém com excelente formação acadêmica, equilibrado economicamente, boa posição social, circulando na alta sociedade, agir contra todos os preceitos, sejam religiosos, jurídicos e de berço? Melhor ficar por aqui!
“O que há de novo no mundo de hoje é que podemos escolher
sobre a que realidade queremos acreditar. Sempre que você escolhe, você decide
a favor de acreditar numa realidade – o que significa desacreditar em outras.
Seja lá o que você vier a escolher, você está decidindo por forma uma verdade
particularizada. Esta é a essência do novo meio”, disse Farhad Manjoo, jornalista
americano, no livro True Enough: Learning to Live in a Post-Fact Society
(Suficientemente Verdadeiro: Como Viver numa Sociedade Pós-Fato, em tradução
livre).
Perfeito!!!